Projeto reúne veículos de comunicação independentes do Nordeste para pensar soluções em acessibilidade no jornalismo

Criado em 2022, o projeto aparece como iniciativa de vanguarda na inclusão de pessoas com deficiência no consumo de notícias

27.09.22

Crédito: divulgação

Por: Eduarda Nunes – Lupa do Bem / Favela em Pauta

Você já parou para pensar como as pessoas cegas e com baixa visão consomem as notícias publicadas pelos veículos de comunicação, sejam elas impressas ou digitais? Pois a Mariana Clarissa pensou nisso, e foi a pesquisa realizada por ela durante o Mestrado em Indústrias Criativas da Universidade Católica de Pernambuco (Unicap) sobre acessibilidade jornalística que deu base a um projeto que envolve o Google News Initiative e uma rede de veículos de comunicação independente do Nordeste do Brasil. 

Em 2022, o Lume, nome dado ao projeto, surge como uma das primeiras iniciativas a propor soluções para a inclusão de pessoas com deficiência no jornalismo por meio de um aplicativo inovador, que foi desenvolvido com a ideia de conectar a comunidade acadêmica ao mercado da comunicação. O projeto desenvolvido por Mariana realizava, inicialmente, uma curadoria de conteúdos acessíveis em portais jornalísticos. 

Carolina Monteiro, diretora da Escola de Comunicação da Unicap e uma das jornalistas idealizadoras do Marco Zero Conteúdo, veículo nordestino referência na comunicação independente brasileira, está diretamente envolvida no projeto. Ela foi a responsável por propor a ampliação da pesquisa de Mariana com uma equipe dedicada a também propor soluções a partir dos resultados encontrados.

A pesquisa contou com uma consulta a pessoas cegas e a portais jornalísticos sobre como funcionam os acesso aos veículos de comunicação. A ideia era entender como eram realizados tanto a oferta, como o consumo de conteúdos jornalísticos para esse público. 

Além disso, os 21 sites mais acessados do Brasil, segundo o ranking da Digital News Report, foram analisados pelos consultores Bruna Alves Machado da Silva e Michel Platini, e foi identificado que nenhum deles cumpria os critérios de acessibilidade. 

O resultado dessa primeira fase foi de que, no geral, os veículos entendem a importância de criar conteúdos acessíveis, mas não sabem muito bem como ou o que fazer. “Às vezes não é preciso dinheiro, só vontade e tempo. Pra tomar a decisão de tornar todo seu conteúdo de imagem em conteúdo audiodescrito, custa você saber como fazer uma boa audiodescrição”, exemplifica Carolina sobre o mito do alto custo financeiro para a promoção da acessibilidade.

Para resultados complexos, soluções integradas

Na fase de proposição de soluções para os problemas encontrados na pesquisa, mais 8 veículos de comunicação independentes do Nordeste puderam integrar uma rede que pensa não só a acessibilidade no jornalismo, mas também a abordagem de temas que as pessoas cegas e com baixa visão acreditam que são importantes para elas. “A gente entendeu que esse era um problema complexo e que precisava de uma solução integrada”, conta Carolina.

A nova equipe do projeto foi formada pelos portais Eco Nordeste (CE), Mídia Caeté e Olhos Jornalismo (AL), Coletivo Retruco e Diadorim (PE), Revista Afirmativa (BA), Agência Saiba Mais (RN) e newsletter Cajueira. Ao longo de 2022, algumas entregas foram realizadas e os eixos em que a equipe se dividiu para trazer as soluções foram os de tecnologia e conteúdo. 

No início do ano foram lançadas uma ferramenta de diagnóstico em acessibilidade de sites e o aplicativo Lume. Na plataforma de diagnóstico, a partir de algumas perguntas, é feita uma análise preliminar do site e cria-se um relatório sobre os principais problemas de acessibilidade do portal e como é possível resolver.  Já o aplicativo disponibiliza matérias dos veículos envolvidos cumprindo todos os itens de acessibilidade e está disponível para download na Play Store.

“Uma coisa que a gente ouvia muito nas entrevistas era de que as pessoas cegas não tinham muito suas pautas atendidas”, conta Carolina, reforçando que também trazer temas e fatos que são importantes de refletir a partir das vivências de pessoas com deficiência também fazem parte da acessibilidade e inclusão social.

Criação de um espaço para dividir observações, experiências e sugestões em acessibilidade

Foi nessa perspectiva que foi criado o LumeCast, um podcast que tem o objetivo de abordar temáticas que foram sugeridas pelo público que participou da fase de pesquisa do projeto

Na primeira temporada do podcast, as discussões de gênero, raça e a autonomia da mulher negra foram os temas discutidos, além da abordagem sobre a criação e a execução do projeto Lume. A próxima temporada será lançada em setembro de 2022, trazendo como tema a desinformação e a educação midiática. 

Carolina chama a atenção sobre o fato de que a falta de acessibilidade nas informações pode abrir espaço para que produtores de conteúdos falsos e enganosos, atentos a essa lacuna, atraiam a audiência das pessoas com deficiências. “Você tem acessibilidade pra desinformação, mas não tem acessibilidade para conteúdo jornalístico de qualidade”, alerta ela.

Além do podcast, um manual de boas práticas para a produção de conteúdo jornalístico acessível às pessoas com deficiência visual também foi criado de modo a guiar veículos de comunicação e demais organizações que tenham o interesse em tornar-se acessíveis. O documento está disponibilizado no site, juntamente com a pesquisa que deu base à criação desses materiais. 


Michel Platini, publicitário e consultor de acessibilidade do projeto Lume. Crédito: arquivo pessoal.

“Com o manual de boas práticas a gente consegue preparar algumas dicas, instruções e diretrizes que jornalistas e portais de jornalismo podem executar no dia a dia de maneira simples e objetiva”, comenta Michel Platini, consultor em acessibilidade, publicitário por formação e cego. “A gente sabe da correria, mas se a gente coloca a ideia de pensar na acessibilidade no cronograma de trabalho, tudo é possível de acontecer”, reforça. Michel faz parte do projeto desde a dissertação do mestrado de Mariana Clarissa, que deu base ao Lume como é hoje. 

Para fortalecer a acessibilidade nos meios jornalísticos

“Muito além de produtos como aplicativo, o estudo etc, acho que é na troca com os profissionais que a gente consegue engajar a mudança na prática inclusiva, incentivando o desenvolvimento de produtos acessíveis”, relata Michel. Além de gerar esse alerta sobre a exclusão de pessoas com deficiência ao conteúdo informativo, o estudo também mostra a necessidade de debater assuntos que são mais relevantes para elas pela condição da própria deficiência em um mundo que é capacitista. 

Para apoiar o Lume, além de fortalecer essas organizações que colaboram para um jornalismo mais acessível, é importante também divulgar o projeto para que mais pessoas com deficiência tenham conhecimento e acesso ao aplicativo e demais produtos. 

O plano futuro do projeto Lume é se tornar uma startup que vai pensar e viabilizar mais projetos que promovam a acessibilidade da melhor forma na área da comunicação. Michel e Mariana são os responsáveis por dar continuidade e ampliar o alcance a mais empresas jornalísticas e também de pessoas com deficiência à informação de qualidade.

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Autor: Redação - Lupa do Bem
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